Itaipu Binacional: Uma visita à usina líder mundial em produção de energia renovável
Visitar a Usina Binacional de Itaipu é um rolê obrigatório para quem está em Foz do Iguaçu ou região. Além de poder conhecer de perto essa grandiosa e importante obra da engenharia mundial, durante a visita é possível entender melhor como se deu o seu processo de construção, aspectos técnicos relacionados ao seu funcionamento, operação e manutenção. Nesse post irei trazer alguns dados e curiosidades sobre a usina, falar da minha experiência na visita além de informações sobre passeios e reservas.
Dois países e uma usina: O tratado de Itaipu
A usina Hidrelétrica de Itaipu está localizada no rio Paraná, na fronteira entre o Brasil e o Paraguai. Dessa forma, o Tratado de Itaipu foi um acordo assinado entre os dois países em 26 de abril de 1973, estabelecendo as bases para a construção e operação da usina. Esse tratado foi fundamental para o desenvolvimento energético da região e ajudou a consolidar a cooperação entre Brasil e Paraguai. Entre os principais pontos desse tratado, cabe destacar:
- Criação da Itaipu Binacional: O tratado estabeleceu a Itaipu Binacional, uma entidade gerida em conjunto pelos dois países, responsável pela construção, operação e administração da Usina Hidrelétrica de Itaipu.
- Divisão da energia gerada: A energia produzida pela usina é dividida 50% para cada país. O Paraguai, que consome menos energia, é obrigado a vender seu excedente ao Brasil, sem poder comercializá-lo com terceiros.
- Financiamento e pagamento da dívida: A construção da usina foi financiada principalmente pelo Brasil. O custo foi pago ao longo dos anos com a venda da energia gerada, sendo que o Paraguai não precisou fazer investimentos diretos, pois os custos foram cobertos pelos empréstimos contraídos pelo Brasil.
- Duração e Revisão do Tratado: O tratado tinha validade de 50 anos a partir da entrada em operação da usina (1984), com revisão prevista para 2023. A renegociação pós-2023 visou permitir maior flexibilidade na comercialização da energia pelo Paraguai e ajustes nas condições econômicas.
Os números de Itaipu
- Potência instalada: 14.000 MW (megawatts). Por fins de curiosidade, o termo “potência instalada” se refere a quantidade de energia que uma fonte pode gerar operando com a sua capacidade máxima (vulgo, “no talo”). No caso de Itaipu, são 20 geradores de 700 MW cada. 20 x 700 = 14.000 MW. Para entender melhor, um único gerador de 700 MW é suficiente para abastecer uma cidade de 1,5 a 2 milhões de habitantes;
- Barragem e reservatório: A altura da barragem é de 196 metros (equivalente a um prédio de 65 andares), com comprimento de 7.919 metros (quase 8 km), sendo utilizado um volume de concreto de 12,3 milhões de m³ (suficiente para construir 210 estádios do Maracanã) na sua construção. Sobre o reservatório, possui uma área de 1.350 km² (equivalente ao tamanho da cidade de São Paulo), comprimento de 170 km e volume de água de 29 bilhões de m³;
- Impacto Econômico e Operação: O custo para a construção de Itaipu foi de aproximadamente US$ 20 bilhões (valores da época). Entrou em operação no ano de 1984 e atualmente fornece cerca de 90% da energia usada no Paraguai e 10% da energia consumida no Brasil. Como o Brasil possui uma matriz energética bastante diversificada, esse valor pode oscilar dependendo de fatores como condições climáticas, preço dos combustíveis e época do ano, mas ficando em torno de 10% ao longo do ano.
A minha experiência em visitar Itaipu
O ponto de partida da visita é no Centro de Recepção de Visitantes de Itaipu. Fica a aproximadamente 10 km do centro de Foz de Iguaçu e pode ser acessado através de ônibus urbanos, aplicativos ou até mesmo veículos particulares. De Uber demora cerca de 20 minutos e custa na faixa de 30 reais. Uma vez no centro de visitantes, é necessário aguardar na fila de credenciamento, onde os visitantes serão separados de acordo com o horário e o tipo de passeio reservado.

São oferecidos basicamente 2 tipos de passeios. O primeiro é o Itaipu Panorâmica, um trajeto externo onde é contada a história e curiosidades sobre a construção da usina. Além disso, o passeio conta com áudio-guia e monitores de turismo para dúvidas e complemento da experiência. Já o segundo é o Itaipu Especial, que conta com parada no mirante central e no mirante vertedouro, parada em cima da barragem, sala de comando central, galeria dos geradores e eixo da turbina. São oferecidos descontos para moradores de Foz do Iguaçu e municípios lindeiros, além de meia entrada. Todas as informações podem ser verificadas diretamente no site oficial da Itaipu Turismo (Itaipu Ingressos e Passeios: Confira nossas opções!).
Optei pelo passeio Itaipu Especial, pois tinha curiosidade de conhecer a parte interna da usina há muito tempo (desde as disciplinas de geração de energia da faculdade de engenharia! rsrs). A bordo de um ônibus panorâmico, seguimos rumo à primeira parada, na parte superior da barragem. De lá é possível ter uma vista bem ampla do trecho rio Paraná após passar pelas unidades geradoras, além dos circuitos que vão desde as saídas dos geradores até a subestação de transmissão de energia (no alto, à direita).



Dando sequência na visita, é chegado o momento de acessar as galerias da usina. Logo na chegada, nos deparamos com os dutos forçados, que são parte importante no processo de geração de energia baseada no princípio de Bernoulli (hidrodinâmica), que considera a relação entre pressão, volume e altura. De forma prática, a água do reservatório está em uma posição elevada (energia potencial gravitacional alta). Ao descer pelos dutos, a energia potencial se transforma em energia cinética, aumentando a velocidade da água. Isso cria um fluxo de alta pressão que movimenta as turbinas da usina, gerando energia elétrica. Para se ter ideia da dimensão desses dutos, basta perceber o tamanho desses em ralação aos carros, na no canto inferior direito da imagem.


No interior da usina, a primeira parada é próxima aos corredores onde estão situadas as tubulações do sistemas de drenagem. Conforme a guia explicou, o processo de cura do concreto é algo que pode levar várias décadas, ou seja, é aceitável que esse apresente pequenas infiltrações na superfície. Essas infiltrações são monitoradas pelas equipes de manutenção civil da usina e tratadas, para que não danifiquem as estruturas. Na sequência, passamos para a sala de controle, o cérebro de Itaipu.



Na sala de controle se encontra o sistema de controle, proteção e supervisão (SPCS) de Itaipu. Através desse sistema, todas as grandezas elétricas da usina (corrente, tensão, frequência, potências) são acompanhadas em tempo real, 24 horas por dia e 7 dias da semana. Através do sistema supervisório é possível verificar os estados de todos os equipamentos da usina, alarmes de monitoramento, dados de geração, sendo possível realizar manobras de maneira remota nos mesmos.
Como Itaipu é um empreendimento binacional, as equipes de trabalho são igualmente divididas entre funcionários brasileiros e paraguaios. Na imagem acima, é possível observar uma linha que passa exatamente na fronteira entre os países e divide a sala ao meio. Ao lado esquerdo dessa linha trabalha o time de operação brasileiro, e no outro o paraguaio. As equipes de ambos os países cumprem jornadas de 8 horas diárias, contando com o apoio de um supervisor de turno e de uma equipe especializada em manutenção.
A próxima parada é a visita ao eixo da turbina, na galeria dos geradores. Se a casa de controle é o cérebro da usina, podemos admitir que o eixo da turbina seja o coração. Após descermos de elevador algumas cotas, chegamos bem próximos ao eixo.

Explicando de maneira simples, um gerador hidrelétrico é composto por uma parte móvel (rotor) e uma parte fixa (estator). O eixo desse gerador é acoplado à turbina que recebe a água vinda dos dutos forçados. O movimento da turbina faz o rotor girar dentro do estator, gerando corrente elétrica por indução eletromagnética. A eletricidade é gerada em 18 kV e na sequência já elevada através dos transformadores elevadores, para só apenas ser conectada ao sistema de transmissão (também chamado de Rede Básica). A energia segue por linhas de transmissão até as cidades, onde é novamente transformada para o consumo doméstico e industrial.


Finalizada a visita no interior da usina, a próxima parada é no mirante do vertedouro, o famoso mirante com os letreiros da usina. É uma parada rápida apenas para fotos e contemplação, garantindo uma vista bem interessante dos vertedouros.


A última parada é no mirante central, o cartão postal de Itaipu. No local inclusive existem fotógrafos profissionais que fazem o registro e a venda das fotos. Acabei adquirindo algumas, e embora o preço seja um pouco salgado (~25 reais por cada foto digital), penso que valeu a pena (garanti a foto do LinkedIn para os próximos anos rsrs).

A visita é encerrada nesse ponto, e fica a critério do visitante permanecer no mirante central ou então pegar um dos ônibus (que saem sob demanda, aproximadamente a cada 5 minutos) em direção ao centro de recepção de visitantes. O mirante central conta com estrutura de lanchonetes, banheiros, bancos, além de telas onde passam os vídeos institucionais da usina. Outro ponto interessante é a presença de funcionários que trabalharam na construção da usina, os chamados “Barrageiros”. Eles são facilmente identificados por estarem usando capacetes dourados e estão sempre rodeados por turistas e demais interessados em ouvir histórias da época da construção.

Não posso deixar de comentar sobre a forma excepcional de como a visita foi conduzida pelas guias da Fundação Itaipu. Infelizmente não lembro o nome das mesmas. Nessa vida de viagens e passeios guiados, poucas vezes tive uma experiência tão positiva como essa. Já havia lido alguns relatos de que o serviço de guia dos funcionários de Itaipu era diferenciado, mesmo assim fui surpreendido.
Curiosidades sobre Itaipu
- Os primeiros visitantes de Itaipu: A primeira visita oficial da usina foi em 15 de abril de 1976. A obra ainda não estava concluída quando foram recepcionados 27 integrantes do Clube de Engenharia do Rio de Janeiro. Desde então, mais de 20 milhões de turistas de todo o mundo já passaram por Itaipu e tiveram a oportunidade de deslumbrar-se com a grandiosidade da hidrelétrica e conhecer os demais atrativos do complexo;
- Armazenar a energia gerada em Itaipu em Baterias: Muitas pessoas questionam sobre a possibilidade de armazenar a energia gerada em Itaipu em baterias, inclusive teve um questionamento nesse sentido durante a visita. É possível? Sim. É viável? Não. O armazenamento de energia em larga escala através de baterias ainda é uma tecnologia pouco explorada em nível mundial. Para se ter uma noção, para armazenar cerca 1 MW de energia, é necessário utilizar uma bateria do tamanho de uma Kombi. Cada gerador tem a potência instalada de 700 MW. Nesse ponto do cálculo já podemos concluir que não se trata de algo plausível;
- De que forma Itaipu pode ser considerada uma fonte de energia renovável? Diferente dos combustíveis fósseis, a água utilizada para gerar eletricidade não é consumida, apenas movimenta as turbinas e retorna ao curso natural. Um dado curioso é que existem cerca de 57 usinas instaladas no rio Paraná e seus afluentes, antes deste passar pelas turbinas de Itaipu. Ou seja, a mesma água que gera energia em Itaipu, já gerou pelo menos outras 57 vezes antes. E seguirá gerando, nas demais usinas instaladas à jusante do rio;
- Aonde é consumida a energia gerada em Itaipu? Essa é uma questão bem complexa de ser respondida. De maneira geral, como a maioria das linhas de transmissão saindo de Itaipu vão em direção ao sudeste (e por esse possuir a maior demanda do país), podemos considerar que essa energia é consumida principalmente no eixo São Paulo – Rio de Janeiro. Olhando como um todo, o sistema elétrico brasileiro pode ser visto como uma enorme malha 98,5% interligada por meio do Sistema Interligado Nacional (SIN), que conecta as principais usinas, linhas de transmissão e distribuidoras de energia no país. Esse 1,5% que ainda não é interligado, corresponde principalmente a comunidades remotas na Amazônia que ainda dependem de geração local, como termelétricas a diesel. Além do estado de Roraima que ainda é isolado do SIN, devendo ser integrado em setembro de 2025 através da ligação Boa Vista – Manaus;
- O desaparecimento dos Saltos de Guaíra: Como todo empreendimento hidrelétrico, a construção do lago de Itaipu impactou severamente a natureza e as comunidades locais. Um dos principais efeitos foi o desaparecimento dos Saltos de Guaíra, também conhecidos como os Sete Saltos. Eram consideradas as maiores quedas d’água do mundo em volume, superando até as Cataratas do Niágara. A água descia com uma força impressionante, criando uma névoa visível a quilômetros de distância, sendo que o som das quedas poderia ser ouvido a mais de 30 km do local. Com o represamento do rio Paraná, após 18 dias do fechamento das comportas a água subiu cobrindo completamente as Sete Quedas. Houve grande comoção popular, com milhares de pessoas indo se despedir dos Saltos antes de serem submersos. Vendo pelo lado positivo, Itaipu trouxe energia para milhões de pessoas e se tornou uma das peças chaves para o crescimento e o desenvolvimento do país.
Dicas e informações finais
- Preciso contratar uma agência de turismo para conhecer Itaipu? Não obrigatoriamente. Os ingressos são vendidos diretamente no site oficial da Turismo Itaipu e as visitas são realizadas exclusivamente por profissionais da Fundação Itaipu. É claro que dependendo da situação (como um grande grupo de idosos ou crianças, por exemplo), contratar um transfer até o centro de visitantes pode ser bastante cômodo e vantajoso. Mas na maioria dos casos, não vejo nada que justifique a contratação de uma empresa intermediadora para o passeio.
- Melhor época do ano para visitar? As visitas em Itaipu ocorrem durante o ano inteiro, sendo que em altas temporadas (fim de ano, feriados) são disponibilizadas inclusive aos finais de semana. A estação do ano não impacta diretamente na experiência, ficando a critério do visitante escolher a melhor data.
- Mudaria algo no roteiro? O roteiro de visitação à Itaipu é realizado pela Fundação Itaipu, não sendo possível realizar alterações. Em uma nova visita, eu faria algum dos roteiros noturnos (Itaipu Iluminada), que prometem ser uma experiência bem diferente dos passeios tradicionais.
De maneira geral, conhecer Itaipu é uma experiência única e que pode tornar a sua visita a Foz do Iguaçu ainda mais completa. Caso tenham ficado dúvidas ou se você tem alguma informação a acrescentar, não deixe de comentar. Até a próxima!