Descobrindo Assunção: tradição, história e vida cotidiana
Assunção, capital do Paraguai, está localizada às margens do rio Paraguai e é uma das cidades mais antigas da América do Sul, fundada em 1537. Conhecida como “Mãe das Cidades”, foi o ponto de partida para diversas expedições colonizadoras na região. A cidade combina história, cultura e vida moderna: abriga importantes construções históricas, além de praças e mercados tradicionais. Assunção tem um clima tropical, com verões quentes e invernos amenos, e oferece uma atmosfera acolhedora e tranquila, destacando-se como o principal centro político, econômico e cultural do país. Nesse post, falarei de como foi a minha passagem por Assunção, além de detalhes sobre sua história, museus e demais atrativos turísticos.
Um destino fora da rota
Se eu falar que planejei com antecedência visitar Assunção ou que essa cidade estava na minha lista dos lugares a serem visitados, estarei mentindo. Decidi fazer essa viagem de total última hora e comprei a passagem a menos de 12 horas para o embarque. Nem mesmo após ter assistido todas as temporadas de “Aeroporto: área restrita”, onde todas as passagens compradas com pouca antecedência acendem um sinal de vermelho para a Polícia Federal, apenas fiz as malas, reservei hospedagens e alguns passeios, fiz uma lista de lugares pra visitar no App do Google Maps mesmo e segui viagem. Até então não tinha muitas informações sobre a cidade, além de que ela é a capital do Paraguai, que remete a boas oportunidades de compras (embora não fosse o meu objetivo da viagem), Foz do Iguaçu, Ronaldinho Gaúcho preso e a um certo baile em que o Chitãozinho e Xororó foram, possivelmente há algumas décadas atrás, onde avistaram várias paraguaias bailando sorridentes (vide galopeira rsrs).
Primeiras impressões sobre a cidade
Mesmo com a escassez de informações, embarquei. O voo de Campinas/SP até Assunção demorou pouco mais de duas horas, e após passar pela imigração já fui logo fazer o câmbio de dinheiro para a moeda local (Guaranis). Até pensei em comprar um chip telefônico para facilitar as coisas, mas como a minha estadia por lá seria curta, resolvi confiar nos mapas offline que havia baixado, na disponibilidade de wi-fi dos estabelecimentos comerciais, além da disposição das minhas pernas para longas caminhadas (que curiosamente são a minha parte favorita dos rolês). O Wi-fi do aeroporto internacional Silvio Pettirossi, que é a principal porta de chegada e saída do país por via aérea, foi suficiente para pedir o meu primeiro uber no país, com destino à primeira parada: a sede da Confederação Sul-Americana de Futebol, também conhecida como CONMEBOL. Havia descoberto horas antes que ela estava situado na capital paraguaia, além de que junto à esta havia o Museu do Futebol Sul Americano, presente em todos os resultados de pesquisas de “lugares pra visitar em Assunção” que fiz.

Talvez por questões de data (era uma sexta-feira à tarde, da semana entre Natal e ano novo), o museu se encontrava fechado, embora no google maps dizia estar aberto. Conversei com o segurança do local e este avisou que as atividades só iriam ser retomadas após a virada de ano. Sem muito o que fazer na ocasião, peguei mais um uber e segui em direção ao centro da cidade, onde além da hospedagem, se encontravam a maioria dos lugares que coloquei no roteiro.
Senti o clima um tanto estranho na região central da cidade, especialmente próximo do palácio da presidência e arredores. Embora a área não estando tão movimentada (se comparada a qualquer grande cidade brasileira, principalmente em um sexta-feira à tarde) haviam muito policiais pelas ruas, pelo menos um a cada esquina, fortemente armados, além de diversos veículos militares. Ao pesquisar sobre a questão da violência na cidade, pude descobrir que a taxa de homicídios em Assunção é relativamente baixa se comparada com muitas capitais latino-americanas: estima-se em cerca de 6,3 homicídios por 100.000 habitantes em 2018. Embora os homicídios sejam baixos, o índice de crimes contra o patrimônio (roubo, furto, assalto) é alto ou considerado “moderado/alto”. No tempo que andei pela região não presenciei nenhuma ação suspeita, e segui com as visitas que havia planejado.

O primeiro ponto foi o Palácio de Lopez, um imponente prédio que hoje abriga o gabinete presidencial e a sede do governo. A construção do Palácio de los López começou em 1857, durante o governo de Carlos Antonio López, e foi idealizada como residência de seu filho, Francisco Solano López, que depois se tornou presidente. O projeto contou com arquitetos e engenheiros europeus, e muitos dos materiais usados vieram da Europa — o que dá ao prédio uma arquitetura neoclássica e elegante, com influência francesa e italiana. As obras foram interrompidas pela Guerra da Tríplice Aliança, nos anos de 1864 até 1870 (período em que serviu como quartel militar) e só foram totalmente concluídas no início do século XX. O palácio tem três andares e uma bela fachada branca e rosada, com colunas e varandas que lembram os palácios europeus do século XIX. São realizadas visitas guiadas no interior do prédio, mas que precisam ser agendadas com antecedência visto que são disponibilizados ingressos limitados por horário. É possível reservar os ingressos pelo site Palacio de López – asunciON!.
Outro lugar situado próximo ao palácio e que com certeza merece uma visita é o Restaurante Bar Casa Clari, que conta com uma culinária variada com foco em pratos paraguaios e latino-americanos e está situado em um terraço que tem vista direta para o Palácio de López, o que torna o local especial para jantar ou até mesmo uma experiência “ao ar livre” no centro da cidade. Como não havia reservado, apenas adentrei e conferi a vista realmente privilegiada do lugar.

No dia seguinte, saí logo cedo em direção à primeira atração do dia, o famoso “Mercado 4”. Situado no bairro Pettirossi, o mercado 4 também se estende para áreas vizinhas como San Roque, Ciudad Nueva e Pinozá. É um mercado multissetorial: frutas, verduras, legumes, mercados de alimentos, mas também “mercados de todo tipo” — moda, roupas baratas, eletrônicos, acessórios, artigos para casa, produtos importados. É um dos principais destinos para quem vêm até a capital paraguaia para realizar compras, além de ser um local onde se encontra comida de rua e bancas que servem pratos típicos paraguaios — o que o torna também uma experiência de gastronomia local.


Conforme já esperado, o mercado 4 possui o tradicional caos paraguaio: grandes movimentações entre os corredores das lojas, vendedores oferecendo produtos que vão desde miúdos de bovinos até camisetas “originais” de clubes, passando por calçados, legumes, eletrônicos e até mesmo ervas de uso recreativo (mesmo não sendo legalizado o comércio no país).
Saindo do mercado, chegou a hora de visitar o primeiro museu do dia, o Museu de Arte Sacra de Assunção (fundação Nicolás Darío Latourrette Bo). Esse museu é um espaço dedicado à arte religiosa, especialmente ao estilo barroco hispano-guaraní. Localizado no edifício chamado “Villa Lina”, região do cerro Antequera, o museu abriga uma coleção significativa de esculturas, pinturas e objetos litúrgicos que datam dos séculos XVII e XVIII.

O museu foi inaugurado em 24 de março de 2010 com abertura ao público em 27 de março do mesmo ano. A coleção base vem da Fundação Nicolás Darío Latourrette Bo, criada em abril de 2008 para preservar e difundir arte, cultura e natureza do Paraguai. A coleção permanente traz quase 100 obras exibidas (com base em uma coleção maior de cerca de 700 peças) de arte sacra, identificadas como uma das mais importantes desse tipo de arte no mundo. O acervo enfatiza esculturas e imagens religiosas produzidas durante o período colonial, especialmente sob influência jesuítica ou franciscana, no estilo barroco-guaraní.


É incrível a riqueza de detalhes das obras, assim como o seu estado de conservação, mesmo após vários séculos de fabricação. Fiz a visita guiada (aproximadamente 20 reais) juntamente com um turista russo que também estava no local. O guia, após nos dar uma visão geral sobre as obras presentes no museu, da sua importância para a preservação da cultura e identidade paraguaio-guarani, nos deixou trancados no interior e saiu resolver algumas questões possoais na rua. Após cerca de 50 minutos e várias batidas na porta, finalmente voltou e abriu. Estávamos sequer com sinal de celular e wi-fi, sem comunicação alguma com o ambiente externo. Já havia aceitado que iria passar a virada de ano por ali rsrs. Após a liberação, segui rumo ao próximo ponto do roteiro, o Museu da Economia do Paraguai.

O prédio que abriga o Museu da Economia do Paraguai é sem dúvida um dos mais fascinantes da capital paraguaia. Sobre o museu, ele é uma iniciativa inédita no país, inaugurada em agosto de 2024 pelo Ministério da Economia e Finanças (MEF). Localizado no centro histórico de Assunção, o museu visa educar o público sobre a evolução econômica do Paraguai, abordando desde sua história até as projeções futuras.

O museu está organizado em quatro seções principais, abordando temas que vão desde os marcos históricos que moldaram a economia do país, uma análise do cenário econômico contemporâneo, perspectivas e desafios econômicos para o futuro, além de destacar o papel do Ministério na gestão econômica nacional.

Além de várias salas de exposições em vídeo, o museu conta com uma seção para falar da geração de energia elétrica, um dos maiores orgulhos nacionais para os paraguaios. Além da Itaipu Binacional, construída através de um consórcio com o governo brasileiro, o país conta com um setor industrial que representa cerca de 20% do PIB do país, atrás apenas do setor de serviços (comércio, turismo, bancos, transporte, educação, saúde), que representam cerca de 60% do PIB.
Um dos pontos interessantes é que o Paraguai tem baixo endividamento público e uma economia relativamente estável. O país se beneficia de um regime tributário mais flexível e baixo em comparação com vizinhos, o que atrai empresas e investimentos externos. O comércio exterior é muito importante para o país, sobretudo exportação de soja, carne e eletricidade. Finalizada a visita, seguimos em direção à próxima parada, o Panteão Nacional dos Heróis.

O Panteão Nacional dos Heróis e Oratório da Virgem da Assunção é um edifício e monumento nacional considerado de grande patrimônio arquitetônico, artístico e cultural. Localiza-se entre as ruas Palma e Chile, no centro da capital paraguaia. Em outubro de 1863, o então presidente Francisco Solano López ordenou a construção de uma capela dedicada à Assunção de Maria, projetada pelo arquiteto italiano Alejandro Ravizza, em colaboração com o construtor Giacomo Colombino. Após a Guerra da Tríplice Aliança, o edifício permaneceu inacabado, cercado por andaimes por mais de 70 anos. Somente após a Guerra do Chaco, em 1936, foi concluído e inaugurado em 12 de outubro daquele ano, por decreto presidencial, como Panteão Nacional dos Heróis.
O Panteão Nacional funciona como mausoléu do Estado, abrigando os restos mortais de várias figuras de grande importância na história paraguaia, como Carlos Antonio López (primeiro presidente constitucional do país), Francisco Solano López (presidente do país entre 1862 e 1870) e José Félix Estigarribia (herói da Guerra do Chaco contra a Bolívia, junto com sua esposa). Além disso, o Panteão também homenageia as crianças mártires da Batalha de Acosta Ñu e dos Soldados Desconhecidos, entre outros personagens históricos de relevância nacional. Na ocasião estava fechado para visitas, sendo possível observar apenas a área externa. Conversando com locais, descobri que é comum que sejam realizadas apresentações artísticas e musicais em frente a este. De fato, passei mais tarde em frente e estava acontecendo uma apresentação com DJ e estrutura de som.
A próxima parada foi no Museu Casa da Independência. Esse museu é um dos locais mais emblemáticos da história do Paraguai. Situado na esquina das ruas 14 de Mayo e Presidente Franco, no centro da cidade, o museu ocupa uma casa colonial construída em 1772 por Antonio Martínez Sáenz e sua esposa Petrona Caballero de Bazán. Este edifício foi palco de reuniões secretas que culminaram na independência do Paraguai da dominação espanhola, proclamada na noite de 14 de maio de 1811.

A casa preserva elementos da arquitetura colonial, com paredes de adobe, teto de telhas e estrutura de palmeiras e tacuaras. Seu interior é decorado com móveis e objetos da época, incluindo retratos dos heróis nacionais e itens pessoais das figuras envolvidas no processo da independência. Ao longo da visita (que é gratuita), é possível passar por todos os cômodos da casa, além de obter informações junto aos totens explicativos disponibilizados em casa ambiente.


Dando sequência ao passeio, a próxima parada foi no Centro Cultural da República – El Cabildo, que é um dos principais museus e centros culturais de Assunção. Localizado na Avenida República, entre as ruas Tebicuary e Manduvirá, ainda no centro histórico da cidade, o edifício é um ícone da arquitetura neoclássica e desempenha um papel central na preservação e promoção da cultura paraguaia.

Originalmente, o edifício serviu como sede do Cabildo de Assunção, órgão administrativo e judiciário da época colonial. Construído no século XIX durante o governo de Carlos Antonio López, o prédio passou por diversas reformas e funções ao longo dos anos, incluindo a sede do Congresso Nacional. Em 2004, foi reaberto como centro cultural, com o objetivo de democratizar o acesso à cultura e fortalecer a memória histórica do país.

O Centro Cultural da República oferece uma variedade de exposições permanentes e temporárias que abrangem diversos aspectos da cultura paraguaia, indo desde à história do edifício e seu papel na administração colonial e na independência do Paraguai, passando pela rica tradição musical do país, com destaque para compositores e intérpretes renomados, além de um acervo dedicado à literatura paraguaia e latino-americana. O prédio é bastante vasto e conta com vários espaços para exposições e eventos, mas o que mais me chamou a atenção foi a arquitetura do mesmo, que conta em seu interior com diversas escadarias metálicas, além de enormes paredes de vidro e uma área em que se pode visualizar a baía de Assunção.


Para finalizar os passeios da manhã, caminhei pela região da Costanera de Assunção. Além de diversas opções de comércios, de lá também foi possível observar o Palácio de Lopez através de outros ângulos, tornando mais evidente a sua riqueza de detalhes e grandiosidade da sua concepção.


Vi algumas recomendações no google sobre os tradicionais rooftops de Assunção, lugares bastante frequentados especialmente durante o pôr-do-sol. Dessa vez me organizei com antecedência e reservei no dia anterior. Chegando no local, pude ter uma visão panorâmica da região costeira, o que reforçou ainda mais o contraste com o caos da região central.


A região do centro histórico de Assunção, embora tenha causado uma certeza estranheza pela presença em massa dos policiais, aparentou ser bastante tranquila. Durante a noite, são muitas as opções de restaurantes, bares, pizzarias e até mesmo baladas. Dois restaurantes bem tradicionais que visitei mas acabei não registrando foram o Lido Bar (Independencia Nacional esq, Asunción 001101, Paraguai) que inclusive registrei o meu e-mail para usar o wi-fi e recebo até hoje mensagens com promoções e eventos rsrs, além do Bolsi (Estrella 399 esq, Asunción 001101, Paraguai), que tem as tradicionais mesas dispostas na rua, comuns em outras capitais da América do Sul.

Para manter a tradição de provar pratos locais, o jantar de despedida foi no Na Eustaquia, um restaurante especializado em pratos com massa e batata, que acabei entrando por pura curiosidade e só depois descobri que é um dos mais bem avaliados da capital. Escolhi o “estofado”, prato feito à base de carne cozida e molho de tomate, guarnecido com espaguete e uma empanada chilena (as empanadas estiveram presentes em absolutamente todas as minhas refeições durante esses dias no Paraguai rsrs).

No meu roteiro, o próximo passo seria pegar um ônibus noturno em direção à Ciudad del Leste, onde visitaria os Saltos del Monday e após isso atravessaria a fronteira. E assim foi feito. Após algumas horas de espera na rodoviária de Assunção, peguei o ônibus até Ciudad del Leste. De lá, negociei um táxi até o Parque Saltos del Monday, no município de Presidente Franco, sendo que no retorno esse me levaria até a ponte internacional.
Sobre os Saltos de Monday (lê-se Mondaí), são cachoeiras impressionantes, formadas pelo Rio Monday, que deságua no rio Paraná em um desnível de cerca de 45 metros. São uma das maiores e mais importantes cachoeiras do Paraguai, sendo muitas vezes comparada a atrativos como o Salto Cristalino, mas com menor fluxo turístico, oferecendo um contato mais tranquilo com a natureza. Embora a atividade turística seja explorada a vários anos no local, tomei conhecimento deste lugar pouco tempo antes da viagem. Também conhecidas como as Cataratas Paraguaias, podem ser visitadas através de dois sítios diferentes. Fui primeiramente no Parque Municipal Monday, que está situado mais ao final da avenida. O ingresso custou certa de 80 reais e o local possui uma estrutura bem completa, contando até mesmo com elevador panorâmico.


O passeio é relativamente curto, visto que a área é bem pequena. Como no data do passeio ainda não havia visitado as cataratas do Iguaçu, deu pra ter uma boa noção do que me aguardaria nos próximos dias, o que me deixou ainda mais empolgado. Como a minha intenção era visitar ambos os sítios, e o taxista estipulou o tempo máximo de passeio em duas horas, segui rumo ao carro onde fomos até o próximo destino, o Parque Aventura Monday. Com a promessa e uma vista espetacular dos saltos, paguei pouco mais de 50 reais e ingressei no sítio. Com uma estrutura repleta de plataformas e escadarias metálicas, pude chegar bem em frente aos saltos.

Esse segundo sítio é bem menos visitado que o primeiro, principalmente pelo difícil acesso devido ao número grande de degraus e escadarias. Porém a vista é tão bonita quanto. De fato, os ingressos possuem um preço um tanto quando salgado para as experiências que é possível vivenciar no local, mas mesmo assim achei bem válido. Fiquei pouco de uma hora caminhando e apreciando o local, voltando ao táxi no horário combinado. De lá, parti rumo à ponte da amizade, onde após dar a saída do Paraguai, ingressei novamente ao Brasil e dei início aos passeios em Foz (que estão detalhados em outros posts aqui no blog).
Mesmo tento sido uma viagem nada planejada, voltei do Paraguai com uma impressão bem diferente da qual havia entrado. Apesar dos poucos dias, pude conhecer vários lugares da principal cidade do país, lugares estes em que a história e as tradições são preservadas e contadas com muito orgulho. As ruas são um verdadeiro museu ao ar livre, resultado de uma rica herança dos povos guaranis e de uma história marcada por diversos episódios que tornaram o povo paraguaio ainda mais forte e corajoso. O Paraguai tem muito a nos oferecer, além de boas opções em mercadorias e produtos a preços tentadores. E boa parte dessas coisas, só se descobre viajando até lá.